*Por Adamo Bazani
Para muitos, uma simples virada no calendário. Para outros, supersticiosos ou não, momento de renovar as forças e a esperança. O ano de 2018 está em seu início, mas já é recheado de notícias e expectativas. A frase “Ano Novo, Velhos Problemas” infelizmente é real na mobilidade.
A falta de prioridade ao transporte coletivo, tanto no espaço urbano como na destinação dos investimentos públicos, é um problema que se arrasta ano após ano. É verdade que após clamores sociais e uma participação maior da imprensa no tema, os responsáveis pelas gestões públicas começaram a ver o transporte coletivo e o não motorizado com mais atenção. Várias ações foram tomadas, mas ainda são insuficientes.
Uma das formas de diminuir as injustiças no uso de verbas públicas para a mobilidade e na ocupação das cidades é o transporte individual financiar o transporte coletivo. Não adiantam discursos demagógicos. Tudo tem um custo, depende de dinheiro. Um corredor de ônibus do tipo BRT, um ônibus mais moderno com ar-condicionado, uma parada ou estação mais adequada… tudo isso é caro.
Os subsídios não podem ser encarados como “bicho de sete cabeças”. Subsídio ao transporte público não é apenas política de mobilidade, mas política social. É uma forma de garantir, principalmente, às pessoas de mais baixa renda e que moram mais longe acesso à saúde, educação, trabalho, renda e lazer.
Um cálculo da tarifa de ônibus de São Paulo elucida bem isso. De acordo com dados oficiais da prefeitura, se não fossem os subsídios, que em 2018 devem ficar entre R$ 2,1 bilhões e R$ 2,3 bilhões, a tarifa que atualmente é R$ 4, iria para R$ 6,66. Mas no mesmo levantamento é evidenciado que, sem o transporte público por ônibus, a maior cidade do País teria gastos a mais na ordem de R$ 750 milhões em combustível para carros, acidentes e poluição do ar. Apesar de, corretamente, o poder público tentar regular a poluição pelos ônibus (isso tem de ser feito mesmo), o vilão do ar é o excesso de veículos nas ruas, em especial carros e motos.
Assim, o subsídio em si não deve ser encarado como problema, mas como solução. A questão é saber de onde saem esses subsídios aos transportes. Em cidades e estados carentes de saúde, educação, segurança e infraestrutura, destinar grandes recursos para tarifas de transportes nem sempre é uma decisão acertada. O ideal é gerar recursos novos e uma das maneiras mais prudentes é fazer com que o transporte individual, que ocupa mais espaço e polui mais, financie o transporte público.
A proposta da Cide Municipal ou Cide Verde, que se arrasta há anos no Congresso, parece ser a alternativa mais concreta. O imposto terá incidência sobre o litro da gasolina, álcool ou gás veicular do transporte individual. A arrecadação financiaria as tarifas dos transportes coletivos, tornando-as mais baratas ou refreando os aumentos futuros.
Pode parecer estranho criar mais um tributo num país cuja carga tributária é elevadíssima, mas, de uma maneira indireta, hoje o mais pobre, que pega o transporte coletivo, é tributado pela tarifa para dar condições para os carros continuarem congestionando as vias. Não se esqueça que além das gratuidades na maior parte do País, as tarifas embutem também impostos.
E grande parte desses impostos do transporte público indiretamente vai também para o transporte individual. A Cide Verde só vai fazer com que haja o caminho inverso: o individual financiar o coletivo.
Diversas cidades do mundo, que investem em transporte público, obtiveram os recursos para esses investimentos criando pedágios urbanos, zonas de restrição cujo acesso de carro é paga, e taxando de forma mais elevada os estacionamentos nas vias. E em muitas dessas cidades, se forem simplesmente convertidas as moedas, as tarifas de transportes públicos ainda são mais caras que as praticadas no Brasil.
Dados de 2016 dos sites jornalísticos de alguns países mostram que a tarifa em Olso (Noruega) é de US$ 5,12; Copenhague (Dinamarca) é de US$ 4,88, Zurique (Suíça) é de US$ 4,66; Estocolmo (Suécia) de US$ 4,52; em Londres (Inglaterra) de US$ 3,70.
Muitos podem questionar que a qualidade dos transportes nesses locais é superior. Mas qualidade tem um custo. Veja as tarifas dessas cidades que são mais altas; em alguns casos, os subsídios chegam a 60{17fa2975a8e501154d6d762c658a26d0839c9e9d43443aad789e2a3cfa55c041} dos custos. O problema no Brasil não é o subsídio em si, mas de onde tirar o dinheiro. Se esses recursos vierem do transporte individual, é a maneira mais justa de “pagar de forma proporcional” a ocupação e os impactos no trânsito das cidades.
Outro aspecto importante para 2018 é que o ano é eleitoral. A despeito de todas as discussões sobre a tão esperada sucessão presidencial, após anos conturbados no Planalto Central (ora no Palácio do Planalto, ora no Palácio do Jaburu) há também as eleições estaduais. Quais as plataformas sobre mobilidade dos candidatos aos governos? E os postulantes a deputados estaduais? – um cargo importante que nem sempre é levado a sério pelo eleitor.
O deputado estadual faz as leis, por exemplo, sobre mais transportes intermunicipais, mais transportes metropolitanos, gratuidades, integrações, etc. Também aprova ou rejeita os orçamentos do Estado, ou seja, o quanto o governador pretende gastar em cada aérea. O país precisa renovar na política. Mas nem sempre o candidato (a) jovem ou que se lança nas eleições pela primeira vez tem a mentalidade renovada. Não adianta o velho costume político numa embalagem nova.
Em relação à economia, os sinais são de melhorias, o que impacta na área de transportes também. Se a economia começar a girar, prefeituras, estados e União arrecadam mais e podem tirar do papel obras paradas. Com mais passageiros, por causa da esperada retomada no nível de emprego (ainda muito lenta), as empresas de ônibus começam a ter mais entradas para investir. Todos ganham.
Mas a recuperação é lenta e o país ainda está com a ferida aberta da política, que ainda pode influenciar na economia. Por isso, que o momento é de otimismo sim, mas com a necessária dose de realismo.
*Adamo Bazani, é jornalista especializado em transporte. Artigo publicado na Revista NTUrbano, edição janeiro/fevereiro2018