Engenheiro Carlos Batinga*
O setor de transportes urbanos já vinha atravessando uma crise histórica que apenas agravou com mais velocidade por conta da pandemia. Só sobreviverá se houver apoio governamental efetivo e rápido, porém temos que considerar que o governo não vai dar dinheiro a fundo perdido para nenhuma empresa de qualquer setor: fato.
Em recente entrevista, o Ministro Paulo Guedes abriu a possibilidade de repassar mais recursos para os municípios que podem usar os mesmos, também, com transporte urbano. Logo, a luta para priorização dos investimentos passa a ser local, assim teremos que formular alternativas consistentes para sensibilizar o prefeito, a Câmara Municipal e a sociedade como um todo de cada cidade, o que não será tarefa fácil, considerando que o MP e Tribunal de Contas também serão instados a participar.
As reestruturações e adequações dos serviços de transportes urbanos já vêm sendo executadas há algum tempo na maioria das cidades brasileiras, isto por conta da acentuada queda de demanda que ocorrida nos últimos anos – mais que 33% de 2013 a 2019, segundo NTU, 12,5 milhões de passageiros só em 2019-, provocando uma queda de 35% de produtividade no setor e no mesmo período o – IPK – Índice de passageiros transportados por quilômetro de 2,42 para 1,56 – também uma degradação na qualidade dos serviços e um desequilíbrio econômico financeiro nos contratos.
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Nesse sentido muitos e bons estudos foram feitos em várias cidades, visando solucionar esses problemas, porém trouxeram poucos resultados positivos por não terem sido implementados, uma vez que a gestão pública não admitiu utilizar recursos externos(extra tarifários), nem sequer procurou extinguir os benefícios, privilégios e gratuidades, que continuam sendo subsidiados pela tarifa, levando a falência do atual modelo, o que está apenas sendo acelerado pela pandemia do Covid–19.
A pandemia não só agrava como torna a questão da sustentabilidade econômica financeira dos sistemas de transportes coletivos impossível de serem resolvidas via tarifa, os sistemas perderam cerca de 70% de suas demandas em cima das perdas históricas de 33%, isto é, se comparado a 2013 a demanda transportada só chega ao patamar de 20%.
O desafio que se avizinha é imenso, pois exige a construção de um novo modelo de gestão, operação e financiamento do transporte urbano, em um cenário que exige rapidez e eficiência, em um ambiente momentaneamente desfavorável:
1. Os órgãos de gerência locais, em sua grande maioria, estão desestruturados na área de planejamento estratégico, necessário para elaborar o novo modelo operacional, os novos contratos, os sistemas de controles e monitoramentos e tudo o mais que a nova ordem exigirá, com transparência e eficiência total, geral e irrestrita.
2. As atuais empresas operadoras que conseguirem sobreviver à pandemia, terão que passar por mudanças estruturais para atender as exigências desse novo modelo, o que não será uma tarefa fácil, dentro da cultura das mesmas.
3. O pacto federativo gerado pela pandemia que deixou o problema do transporte urbano para ser discutido e “solucionado” isoladamente em cada cidade e/ou região metropolitana.
Assim, estamos presenciando a ruptura de um ciclo dos transportes urbanos, o que não surpreende aqueles que militam na área, que veem reiteradamente alertando às autoridades das 3 esferas de governo sobre esse desfecho, já era uma “Crônica de uma morte anunciada”, apenas o coronavírus precipitou os acontecimentos.
Temos muito trabalho pela frente, mas com certeza vamos ressurgir melhores e mais fortes, mesmo brotando das cinzas.
*Carlos Batinga é consultor em Mobilidade Urbana e Membro dos Conselhos Diretor do Instituto MDT e da ANTP.